Coordenador da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, o procurador Deltan Dallagnol nega que a operação esteja escondendo segredos, como sugeriu o procurador-geral da RepĂșblica, Augusto Aras, hĂĄ duas semanas. Segundo Deltan, os mais de 500 terabytes de informações sob custódia do seu grupo envolvem apreensões e relatórios dos Ășltimos seis anos. "Se dividir pelas 70 fases da Lava-Jato, corresponde a cerca de 14 computadores (por fase), o que é normal", diz o procurador, em entrevista concedida por e-mail ao jornal O Estado de S. Paulo.
Na semana passada, Aras defendeu uma "correção de rota" no trabalho da Lava-Jato que, em suas palavras, seria uma "caixa de segredos".
Para a cĂșpula da PGR, o acesso a informações mantidas sob sigilo pela força-tarefa é importante para saber se autoridades com foro foram investigadas em Curitiba.
Deltan também comentou o conjunto de novas regras para acordo de leniĂȘncia, assinado quinta-feira, que deixa o Ministério PĂșblico Federal (MPF) de fora: "Desmonte de um modelo de combate à corrupção que funcionou."
Que segredos a Lava-Jato guarda e a PGR quer ter acesso?
Não hĂĄ segredos. Todas as investigações e documentos estão registrados no sistema do Ministério PĂșblico, na Justiça Federal ou na PolĂcia Federal. Todos são sindicĂĄveis. Todo ano a corregedoria (do MP) faz uma inspeção e constata a regularidade do nosso trabalho. Dizer que a força-tarefa guarda segredos, investigações secretas, bancos de dados escondidos, é infactĂvel e absurdo.
Por que a força-tarefa tem informações de 38 mil pessoas?
Esse é o nĂșmero de pessoas fĂsicas e jurĂdicas mencionadas em relatórios de inteligĂȘncia financeira, as quais são suspeitas ou se relacionam com pessoas suspeitas de lavar dinheiro. Não é o nĂșmero de investigados pela força-tarefa.
O acervo da Lava-Jato é oito vezes maior que o do MPF todo, como disse Aras?
Os 40 terabytes de um sistema do MPF (citados por Aras semana passada) não incluem materiais apreendidos, como arquivos de ĂĄudio ou vĂdeo encontrados em celulares e computadores. Os mais de 500 terabytes da Lava-Jato são de apreensões e outras grandes operações. Se dividir isso pelas 70 fases da Lava Jato, significa que foram apreendidos cerca de 7 terabytes, em média, por fase. O que corresponde a cerca de 14 computadores com memória entre 500 gigabytes e 1 terabyte, o que é normal.
Por que vocĂȘ acha que a PGR não deve acessar esses dados?
O instrumento jurĂdico usado pelo procurador-geral para ter acesso às informações foi inadequado, assim como, a meu ver, foram incorretas as afirmações de que estarĂamos criando resistĂȘncia injustificada e investigando pessoas com foro. O acesso indiscriminado é ilegal. Até na PolĂcia Federal, em que hĂĄ hierarquia, diferente do MPF, o delegado-geral não tem acesso a informações de investigações sigilosas.
Governo e Supremo assinaram termo para acordos de leniĂȘncia sem participação do MPF. Isso afeta o combate à corrupção?
Se esse acordo de cooperação técnica fosse lei em 2014, não terĂamos os acordos de leniĂȘncia da Lava Jato, que permitiram a expansão das investigações e a recuperação de bilhões de reais.
As novas orientações dão grande controle sobre leniĂȘncias para o Executivo.
Como poderia o Executivo coordenar os primeiros acordos da Lava-Jato que entregavam informações e provas sobre crimes cometidos por seus integrantes?
Embora o aperfeiçoamento do sistema seja necessĂĄrio, percebe-se o desmonte de um modelo de combate à corrupção que funcionou e alcançou importantes resultados no Brasil nos Ășltimos anos.
Pode ser um avanço ao incorporar a experiĂȘncia exitosa de grandes investigações como a Lava-Jato. Contudo, precisa ser extremamente independente em relação a interferĂȘncias externas.
Fonte: Correio Braziliense